sexta-feira, 20 de setembro de 2013

A nossa "Exótica" Cultura Brasileira

       Porque quando alguma mulher branca diz que prefere homens negros ela já diz com um sorriso malicioso no rosto, e já sabe que ouvirá risadas, e piadas como "Safadinha!", "Não é boba nem nada!"? Porque quando vamos para um centro de Umbanda ou Candomblé falamos para algumas pessoas como se fôssemos desbravadores? Porque quando dizemos que alguém é da umbanda ou do candomblé, falamos como se essa pessoa fosse de alguma seita secreta ou bruxaria? Coloco isso no coletivo porque eu hoje percebo que também faço parte da enorme lista dos europeizados brasileiros. Acabei de inventar este termo. Será?

Tambor de Crioula (foto tirada do site do Ministério da Cultura)
       Essa semana participei de uma oficina de Tambor de Crioula no Teatro Cit-Ecum, todos os dias, das 10h às 13h. Tambor de Crioula é uma expressão afro-brasileira, que mistura dança, percussão e cantos populares que reverenciam São Benedito. Para ser realizada, não precisa de data ou lugar específico. O grupo que me ensinou um pouco dessa cultura popular foi o do finado Mestre Felipe, uma das mais importantes figuras da cultura popular brasileira e maranhense.

       Mas porque raios uma oficina de cultura brasileira me fez pensar essas coisas? Simples: moro em uma metrópole, no sudeste do Brasil, que prefere a cultura estrangeira a qualquer outra coisa. Eu mesma, que sempre me considerei uma pessoa brasileira (gosto de samba, MPB, poxa!) me peguei mais pra lá do que pra cá. Explico: sou atriz. O teatro que aprendemos é o teatro europeu, tanto a técnica base que vem da Rússia, como a forma de fazer. O que eu, como brasileira, faço para aproximar a minha linguagem artística da linguagem do meu povo? Absolutamente nada.

       Pois é. Estou me dando um soco da cara. Gostar de samba, MPB, axé, capoeira, de Brasil é fácil! Tudo isso, essa nossa música, a dança, o nosso modo de ser (feliz, simpático, mulher bunduda, gostosa, sexy)... tudo isso foi comprado - e reconhecido- pelo resto do mundo, como já disse Carmem Miranda "Disseram que eu voltei americanizada". Tudo o que é reconhecido, taxado, lacrado como brasileiro lá fora, aqui passa a ser visto, reconhecido e quase um "orgulho nacional". Quase todo mundo gosta de samba, e sabe alguma dança de Axé, todos sabem mais ou menos o que é capoeira, todos já ouviram pelo menos uma vez as MPBs das antigas. Agora, aquilo que ainda não foi proclamado lá fora não existe no Brasil. É o caso do Tambor de Crioula. Sim, é patrimônio imaterial brasileiro. Já é um passo! Mas ouvir o produtor do grupo dizer que no Maranhão os prefeitos preferem chamar os cantores de Axé da Bahia nas festas populares maranhenses significa que o brasileiro não dá a menor importância para o que fabrica.

        Mais exemplos! Aqui em São Paulo, quantos conhecem alguma coisa da cultura popular do interior paulista, ou de qualquer outra parte do Brasil? Os que respondem afirmativamente provavelmente são os "artistas", "bicho-grilo" (pessoas consideradas exóticas), que procuraram, caçaram e encontraram em algum canto de São Paulo alguma coisa brasileira. E eu, honestamente e com muita vergonha, me coloco na parte que responde negativamente. Conheço o projeto Revelando São Paulo, do Abaçaí Cultura e Arte. Espera... conheço não, já ouvi falar.

        É muito triste saber que eu, uma pessoa que fala aos quatro cantos "sou atriz", "quero trabalhar com cultura", desconheço tanta coisa da nossa cultura. Sou vítima - ou não - da educação européia, da tentativa de esbranquiçar o Brasil que vem desde o início da nossa história. Eu, que desfilo no carnaval, que ouço muita música brasileira, eu mesma, não conheço o Brasil. Porque o Brasil tá escondido em várias partes do interior, o Brasil tá escondido nas casas das pessoas mais velhas, nas casas de cultura popular, nas festas de santo mais tradicionais e menos marketeiras
. E foi escondido por nós, europeus, que queriam de toda a forma transformar o Brasil em um Estados Unidos tropical, afinal, é o melhor país para se viver, não é mesmo?

        Ainda temos muito o que aprender com aqueles que defendem a nossa cultura popular, que vem de boca a boca, nas rodas de conversa, nas rodas de batuque, de samba, que vem daqueles que não damos o menor valor, porque nós do sudeste praticamente não moramos no Brasil, estamos aqui só de passagem, e ignoramos qualquer ruído que não foi reconhecido lá fora. É Brasil....

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